A tutela antecipada contra a fazenda pública na visão do STJ
A Lei 9.494/97
disciplina a aplicação da tutela antecipada contra os cofres públicos.
Desde sua edição, como todas as quase 13 mil leis já editadas no Brasil
desde o início do século passado, a norma é submetida com frequência ao
crivo do Judiciário. Veja como o Superior Tribunal de Justiça (STJ)
interpreta essa legislação.
Para o Tribunal, a vedação do artigo 1º dessa lei à concessão de
tutela antecipada contra a fazenda pública nos casos de aumento ou
extensão de vantagens a servidor público não se aplica, por exemplo, na
hipótese de se buscar nomeação e posse em cargo público em razão de sua
aprovação. É o que foi decidido pelo ministro Arnaldo Esteves Lima na
Quinta Turma, no Agravo de Instrumento (Ag) 1.161.985.
A mesma Quinta Turma afirmava, em 2009, que os artigos 1º e 2º-B da
lei devem ser interpretados de forma restritiva. Assim, não incidiriam
na vedação à tutela antecipada a ordem de reintegração de militar ao
serviço ativo e a realização de tratamento de saúde. Para o ministro
Jorge Mussi, relator do Recurso Especial (REsp) 1.120.170, o pedido não
se enquadra no impedimento legal, já que não visa reclassificação ou
equiparação de servidor nem concessão de aumento ou extensão de
vantagens.
De outro lado, o ministro Mussi apontou, no Recurso em Mandado de
Segurança (RMS) 25.828, que a pretensão de cumular vantagens pessoais
incorporadas com subsídio constitui efetivo desejo de obter aumento de
vencimentos, atraindo a incidência do artigo. Hipótese diversa do
restabelecimento de pagamento por exercício de função comissionada,
conforme entendimento do ministro Felix Fischer no REsp 937.991, que
autorizou a incidência da antecipação de tutela no caso.
O ministro Arnaldo Esteves Lima, no REsp 845.645, também diferenciou
a tutela antecipada que determina o pagamento de vencimentos ao
servidor da que determina somente o bloqueio de verbas públicas para
garantia do eventual pagamento futuro desses vencimentos. Esta segunda
hipótese seria permitida, ao contrário da primeira.
Status quo ante
Em 2004, o ministro José Arnaldo da Fonseca, hoje já aposentado,
relatou um caso em que a administração havia suspendido, por ato
interno, os efeitos de decisão transitada em julgado favorável aos
servidores. Uma nova ordem judicial concedeu tutela antecipada para
suspender esse ato. Para a Universidade Federal de Santa Maria, essa
concessão violava a vedação legal.
O relator do REsp 457.534 esclareceu que o caso não seria de
extensão de vantagem, mas de manutenção da situação anterior ao ato
administrativo, respaldada por decisão judicial transitada em julgado.
De modo similar, na Reclamação (Rcl) 2.307, o STJ entendeu que a
decisão que determina a reintegração de servidor não constitui nova
relação jurídica entre as partes, mas apenas restitui a situação
anterior. Não seria, portanto, determinação de inclusão do particular na
folha de pagamentos da administração, o que estaria vedado pelo artigo
2º-B da lei.
Multa e depósito recursal
A lei também dispensa a fazenda do pagamento antecipado de depósitos
recursais. Aplicando o princípio ubi eadem ratio ibi eadem dispositio,
isto é, onde há uma mesma razão, aplica-se o mesmo dispositivo, o STJ
reconheceu que o artigo introduzido pela Medida Provisória 2.180-35/01
dispensa a fazenda do pagamento antecipado da multa por apresentação de
recurso protelatório. É o que foi decidido nos Embargos de Divergência
em Recurso Especial (EREsp) 808.525, EREsp 695.001 e REsp 1.070.897, por
exemplo.
Mas o ministro Arnaldo Esteves Lima esclareceu, no REsp 778.754, que
a dispensa do depósito prévio não significa isenção do pagamento nem
vedação de condenação da fazenda pública pelo uso de recurso
manifestamente inadmissível ou infundado. O STJ também decidiu, no Ag
990.116, que a dispensa do pagamento antecipado não se estende a
conselhos profissionais, apesar de seu caráter autárquico.
Prazo de embargos
O Código de Processo Civil (CPC) prevê em seu artigo 730 que o prazo
para embargos em ação de execução contra a fazenda é de dez dias. Isto
é, o ente público pode contestar a execução por quantia certa em até dez
dias da citação. Porém, a Medida Provisória 1.984-16/00 introduziu novo
artigo na Lei 9.494, passando esse prazo para 30 dias.
Apesar de esse dispositivo ter começado a viger pela primeira vez em
7 de abril de 2000, a Fazenda Nacional tentava, no REsp 787.548, entre
outros, fazer com que valesse para um prazo aberto em 11 de junho de
1999. O STJ entendeu que a nova previsão legal não poderia ser aplicada
às situações ocorridas antes de sua vigência.
O STJ também afirmou que, apesar de não convertida em lei, a medida
provisória mantinha sua vigência, conforme previsto em emenda à
Constituição (REsp 572938), e que sua aplicação era imediata, por ter
natureza processual (REsp 718.274).
Honorários sem embargo
A medida provisória de 2001 também incluiu previsão de isenção de
honorários advocatícios em condenações da fazenda, na hipótese de
execuções não embargadas. Mas a Corte Especial do STJ editou em 2007 a
Súmula 345, afirmando que “são devidos honorários advocatícios pela
fazenda pública nas execuções individuais de sentença proferida em ações
coletivas, ainda que não embargadas”.
O ministro Arnaldo Esteves Lima, em precedente da súmula, explicou a
razão de ser da diferenciação: o trabalho do advogado. “Não se pode
menosprezar o trabalho do advogado, considerando a peculiaridade de cada
ação. Na ação civil coletiva, discute-se o interesse individual
homogêneo de uma categoria; na execução da sentença condenatória
proferida nessa ação, a individualização, a titularidade do credor, além
do montante devido, que muitas vezes sequer fora apreciado no processo
cognitivo”, esclareceu.
“O fato de ser possível que a execução individualizada seja
promovida pelo próprio advogado que atuou no processo de conhecimento
não pode determinar-lhe prejuízo, tendo em vista as características de
cada ação, conforme exposto”, completou o relator do REsp 697.902.
Em recurso repetitivo, o STJ também definiu que a isenção de
condenação a honorários não incide em caso de execução fiscal, isto é,
promovida pela fazenda (REsp 1.111.002). Também não incide a vedação,
conforme entendeu o STJ na Ação Rescisória (AR) 3.382, na hipótese de
execução de obrigações de pequeno valor, porque a lei só impede os
honorários na execução por quantia certa, expressamente.
Erro de cálculo
Em outra súmula relacionada à Lei 9.494, a de número 311, o STJ
dispôs que “os atos do presidente do tribunal que disponham sobre
processamento e pagamento de precatório não têm caráter jurisdicional”.
Assim, erros de cálculo na execução não fazem coisa julgada e podem ser
corrigidos administrativamente (REsp 1.176.216).
Assim, o presidente do tribunal pode, até mesmo, excluir juros
moratórios e compensatórios, se isso não exigir ingresso nos critérios
jurídicos definidos no título em execução (RMS 29.245). Mas, em um caso
concreto, o STJ impediu que a presidência do Tribunal de Justiça de São
Paulo (TJSP) substituísse o percentual de 70,28% por 42,72% relativos ao
IPC de janeiro de 1989. No RMS 29.744, o STJ afirmou que esse
percentual foi objeto de coisa julgada no caso analisado, não se
tratando de mero erro material passível de alteração administrativa.
Abrangência
O artigo 2º da lei consolidou entendimento anterior do STJ. Para a
Corte, a sentença em ação civil pública fazia coisa julgada erga omnes
nos limites da competência territorial do órgão julgador. A lei de 1997
respaldou esse entendimento, excetuando apenas a hipótese de
improcedência do pedido por falta de provas.
Apesar de entendimentos contrários isolados, no sentido de estender
os efeitos da sentença para além do alcance territorial do órgão
julgador, o STJ acabou por confirmar esse entendimento (EREsp 411.529).
Outro artigo incluído pela medida provisória de 2001 restringia a
substituição processual por associação aos substituídos com domicílio
dentro da competência do órgão julgador na data de propositura da ação.
Com base nesse artigo, o STJ impediu que associações de policiais
federais dos estados de Santa Catarina e do Espírito Santo ingressassem
com ações em favor de seus associados nos tribunais do Rio Grande do
Norte (REsp 786.448).
A medida provisória também introduziu a necessidade de que, nas
ações coletivas contra entes públicos, fosse juntada à petição inicial a
ata da assembleia autorizando a associação a ingressar em juízo, com a
relação nominal e endereços dos associados. Mas o STJ, no EREsp 497.600,
excluiu essa necessidade das entidades de classe, inclusive sindicatos e
entes representativos.
Execução provisória
A lei prevê ainda a vedação à execução provisória em determinados
casos. O STJ entende que esse rol de vedações é taxativo, devendo ser
limitado às hipóteses expressamente listadas (REsp 1.189.511).
Assim, é possível a execução provisória nas hipóteses de pensão por
morte (Ag 1.168.784), reforma de militar por alienação mental (REsp
1.162.621), promoção de servidor (REsp 1.199.234), levantamento de
depósito voluntário pela administração (REsp 945.776), reserva de vaga
em concurso (REsp 764.629) e benefício previdenciário (Ag 720.665),
entre outras hipóteses. http://dlvr.it/4CdvWG
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