24/01/2018 20:07:44





A 8ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) confirmou hoje (24/1), por unanimidade, a condenação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva pelos crimes de corrupção passiva e
lavagem de dinheiro, passando a pena de nove anos e seis meses para 12
anos e um mês de reclusão em regime fechado e pagamento de 280
dias-multa (com valor unitário de cinco salários mínimos). Esta foi a
24ª apelação criminal julgada pelo tribunal contra sentenças proferidas
em ações oriundas da Operação Lava Jato.
A apelação criminal envolve o favorecimento da Construtora OAS em
contratos com a Petrobras, com o pagamento de propina destinada ao
Partido dos Trabalhadores e ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva,
por meio de apartamento triplex do Condomínio Edifício Solaris, no
Guarujá, litoral de São Paulo, e do depósito do acervo presidencial.
Além do ex-presidente, foram julgados recursos envolvendo outros seis
réus. No caso do ex-presidente da OAS José Aldemário Pinheiro Filho
(Leo Pinheiro) e de Agenor Franklin Magalhães Medeiros, ex-diretor da
área internacional da OAS, a Turma acolheu o pedido do MPF, tendo em
vista o benefício da colaboração de ambos, e reduziu as penas fixadas na
sentença de primeiro grau (ver ao final do texto).
Em relação ao ex-presidente do Instituto Lula Paulo Tarciso Okamotto,
que foi absolvido do crime de lavagem de dinheiro em primeira
instância, no caso do acervo presidencial, a 8ª Turma manteve a
sentença, negando o pedido de alteração do fundamento legal da
absolvição. Ele requeria que constasse “não existir prova de que o réu
tenha concorrido para a infração penal” e não a falta de provas
suficientes.
Os desembargadores também entenderam por manter a absolvição dos ex-executivos da OAS Paulo Roberto Valente Gordilho, Roberto Moreira Ferreira e Fábio Hori Yonamine (lavagem de dinheiro).
Início do julgamento
Às 8h32, o presidente da 8ª Turma, desembargador federal Leandro
Paulsen, abriu os trabalhos da sessão de julgamento. Ele lembrou que o
TRF4 tem feito esforços para cumprir as metas do Conselho Nacional de
Justiça, prestando jurisdição o tanto quanto possível qualificada e
célere. “Para este ano de 2018, constitui a meta 4 priorizar os
processos relativos à corrupção e à improbidade administrativa, o que
será observado”, salientou o magistrado.
Após, o desembargador federal João Pedro Gebran Neto fez a leitura do
relatório referente à apelação, fazendo um histórico do processo, desde
sua autuação, passando pela sentença do juiz de primeiro grau e
trazendo os pedidos feitos pelo Ministério Público Federal (MPF) e pelas
defesas dos réus em seus recursos apresentados perante o TRF4.
Parecer do MPF e sustentações orais
O procurador regional da República Mauricio Gotardo Gerum reforçou os
pedidos apresentados no parecer do MPF. O órgão ministerial pediu a
ampliação das penas fixadas para o ex-presidente Lula, a aplicação de
atenuantes para Leo Pinheiro e Agenor Franklin Magalhães Medeiros,
ex-diretor da área internacional da OAS, e a condenação de três
ex-executivos da OAS, Paulo Roberto Valente Gordilho, Roberto Moreira
Ferreira e Fábio Hori Yonamine, absolvidos em primeira instância.
“Lamentavelmente, Lula se corrompeu”, destacou Gerum em sua
manifestação. “O que parecia ser uma construção de uma governabilidade, a
partir de indicações políticas, nada mais era do que a criação de um
mecanismo de dilapidação dos cofres estatais”. Conforme o procurador, a
defesa não conseguiu apresentar qualquer argumento consistente que
afastasse o conjunto probatório apresentado. E ressaltou: “Não é porque
se trata de um ex-presidente da República que nós só vamos aceitar como
prova a escritura assinada ou recibo da corrupção com firma reconhecida
em cartório”.
Assistente de acusação, o advogado da Petrobras René Ariel Dotti
lamentou que, por mais de uma vez, a maior indústria petrolífera do
Brasil, uma das maiores do mundo, sofra um atentado gravíssimo contra o
seu patrimônio. “A Petrobras espera que o TRF4 confirme a orientação de
que o produto retido pelo crime reverta em seu favor numa espécie,
inclusive, de justiça reparativa, além de fixar o valor mínimo para a
reparação dos danos causados pelas infrações".
O advogado Fernando Augusto Henrique Fernandes, representando Paulo
Okamotto, sustentou da tribuna pedindo a troca de fundamentação da
sentença absolutória do ex-presidente do Instituto Lula, para que fosse
considerado inocente e não absolvido por falta de provas. Lembrou que a
lei considera acervos presidenciais como patrimônio público cultural
brasileiro e que se apresentou como testemunha de defesa o ex-presidente
Fernando Henrique Cardoso. “O depoimento do ex-presidente deixa claro o
interesse público do acervo e todas dificuldades que se tem para manter
e custear um acervo presidencial”, frisou.
Último a falar, o advogado do ex-presidente Lula, Cristiano Zanin
Martins, pediu a absolvição de seu cliente. “´É necessário haver a
prova, o nexo da função pública com a vantagem recebida. Criticou que a
sentença fala em atos de ofício indeterminados. “Não houve o recebimento
de vantagem indevida. “O presidente Lula não é o proprietário do
triplex, jamais recebeu as chaves ou passou um dia”, ressaltou.
Para Zanin, a sentença se baseia apenas na palavra de Leo Pinheiro,
que é co-réu e não precisa falar a verdade. “O que temos aqui é um
processo nulo que gerou uma sentença nula e também um processo na qual
não foi feita a prova da culpa, mas sim a prova da inocência", disse. "O
que se pede é que seja reconhecida uma questão de justiça", concluiu.
Votos dos desembargadores
Em um extenso voto com cerca de 430 páginas, o relator, desembargador
federal João Pedro Gebran Neto, iniciou negando as cerca de 30
preliminares trazidas pelas partes. Quanto ao mérito da apelação, o
magistrado entendeu que no caso de Lula, Leo Pinheiro e Medeiros,
condenados pelo juiz federal Sérgio Moro em sentença proferida em 12 de
julho de 2017 por corrupção ativa e passiva e por lavagem de dinheiro, a
prova oral e documental corrobora a versão da acusação de que o
ex-presidente e a ex-primeira-dama eram os proprietários do triplex e
que as reformas promovidas pela empreiteira OAS foram destinadas a eles
como pagamento da porcentagem de propina reservada ao ex-presidente como
retribuição pelo fechamento de contratos da empreiteira com a
Petrobras.
“Me parece extremamente relevante o fato de ter havido uma visita,
terem sido realizados projetos e, posteriormente, ter sido feita a
apresentação desses projetos na residência do ex-presidente e da
ex-primeira-dama, havendo aprovação. Depois, ainda houve uma segunda
visita para verificar as reformas”, escreveu em seu voto.
Para Gebran, “vários detalhes vão somando, dando a certeza de que os
fatos ocorreram dessa forma”. Conforme o desembargador, “há prova acima
de dúvida razoável de que a unidade do triplex estava sim destinada ao
ex-presidente como vantagem, apesar de não formalmente transferida
porque sobreveio a Operação Lava Jato e com ela, a prisão de
empreiteiros envolvidos, entre eles José Aldemário”. A transferência
anterior da unidade para o ex-presidente ou a ex-primeira-dama, explicou
Gebran, não é essencial para a caracterização da lavagem de dinheiro,
justamente porque o contexto mostra-se compatível com o propósito de
ocultar ou dissimular a titularidade ou origem do bem.
Segundo o desembargador, a situação é idêntica a se o apartamento
fosse colocado no nome de um laranja. Neste caso, a ausência da
transferência transforma a OAS em um mero laranja do verdadeiro titular
dessa unidade.
Ao elevar a pena, o desembargador entendeu que há culpabilidade
extremamente elevada no caso, por tratar-se de ex-presidente da
República que recebeu valores decorrentes da função que exercia, e de
esquema de corrupção que se instalou durante o exercício do mandato, do
qual se tornara tolerante e beneficiário. “É lembrar que a eleição de um
mandatário, em particular de um presidente da República, traz consigo a
esperança de população em melhor projeto de vida”, pontuou.
Gebran manteve a absolvição de Okamotto, mas negou a alteração do
fundamento da sentença pedida pela defesa do ex-presidente do Instituto
Lula. Em relação aos outros réus, também manteve a absolvição dos
ex-executivos da OAS Paulo Roberto Valente Gordilho, Roberto Moreira
Ferreira e Fábio Hori Yonamine do crime de lavagem de dinheiro, no que
foi acompanhado pelos demais integrantes da 8ª Turma.
Gebran finalizou seu voto fazendo uma reflexão: “no banco dos réus,
está um ex-presidente que, por dois mandatos, comandou um país. Isso
torna a tarefa do julgador mais sensível e dramática. Mas, reforçou o
magistrado, nada disso pode abalar a isenção de ânimo ou a
imparcialidade do julgador. “Não julgamos o nome ou personagem, ou ainda
um reconhecido estadista. Julgamos fatos concretos, os quais foram
examinados e julgados dentro da mais perfeita moldura constitucional da
legalidade, das provas e dos limites da minha capacidade”, finalizou.
O revisor, desembargador federal Leandro Paulsen, acompanhou
integralmente o voto do relator. Ele destacou que o caso em análise “não
trata de pequenos desvios de conduta, fragilidades morais, sutil
deterioração dos costumes”. “Estamos tratando é da revelação de uma
criminalidade organizada envolvendo a própria estrutura do Estado
brasileiro, com prejuízo inequívoco às suas perspectivas de
amadurecimento, de crescimento e de desenvolvimento. O fato de se tratar
de alguém processado por maus feitos praticados quando do exercício da
presidência é um elemento relevantíssimo a ser considerado”, frisou.
Paulsen ressaltou que, neste tribunal, não se aceita condenação
baseada apenas em delações. “É inequívoco o vínculo de causalidade entre
a conduta do ex-presidente Lula e os crimes praticados. Luiz Inácio
agiu pessoalmente para tanto, bancando quedas de braço com o Conselho da
Petrobras, forte na condição de presidente da República”, disse o
revisor da apelação, “tendo até ameaçado substituir os próprios
conselheiros caso não fosse confirmada a indicação”.
“Há elementos de sobra que demonstram que Lula concorreu para os
crimes de modo livre e consciente, que concorreu para viabilizá-los e
para perpetuá-los”, destacou o desembargador. Não se trata simplesmente
da sua superioridade hierárquica enquanto presidente, mas do uso que fez
desse poder, concluiu.
Para o desembargador federal Victor Luiz dos Santos Laus, último
integrante da 8ª Turma a votar, o colegiado não julga pessoas, julga
fatos. “O que está em julgamento nesta tarde é um fato detectado nessa
investigação que, tendo chegado ao conhecimento das autoridades
policiais e ao MPF, apurou um juízo de que algo de errado teria
acontecido. “A nós, interessa o fato, aquilo que de concreto aconteceu”,
frisou.
De Lula, ressaltou o magistrado, era esperada uma postura diferente.
Ciente dos fatos em seu entorno, explicou o magistrado, deveria ter
tomado providências, mas ficou em silêncio, e auferiu proveito dessa
situação. “São fatos que deslustram a biografia, mas são fatos concretos
e devem receber o escrutínio de um processo judicial”, afirmou. Para
Laus, expostas às críticas da defesa, as provas resistiram. “Fossem elas
frágeis, não teriam resistido ao embate, mas resistiram”, concluiu.
O julgamento da apelação criminal encerrou às 17h45min, após mais de
8h de sessão, quando o presidente da 8ª Turma, proclamou o resultado
final.
Como ficaram as penas:
Luiz Inácio Lula da Silva: condenado por corrupção passiva e
lavagem de dinheiro. A pena passou de 9 anos e 6 meses de reclusão para
12 anos e um mês, a ser cumprida em regime inicial fechado. Também foi
condenado ao pagamento de multa no valor de 280 dias-multa (valor
unitário do dia-multa de 5 salários mínimos vigentes ao tempo do último
fato criminoso);
José Aldemário Pinheiro Filho: condenado por corrupção ativa e
lavagem de dinheiro. A pena foi reduzida de 10 anos e 8 meses de
reclusão para três anos, seis meses e 20 dias de reclusão, a ser
cumprida em regime inicial semi-aberto. Também foi condenado ao
pagamento de multa no valor de 70 dias-multa (valor unitário do
dia-multa de 5 salários mínimos);
Agenor Franklin Magalhães Medeiros: condenado por corrupção ativa. A
pena passou de 6 anos de reclusão para um ano, dez meses e sete dias de
reclusão, a ser cumprida em regime inicial aberto. Pagamento de multa no
valor de 43 dias-multa (valor unitário de 5 salários mínimos).
Execução da pena
A determinação de execução provisória da pena é feita pela 12ª Vara
Federal de Curitiba, responsável pelas execuções penais. No entanto,
essa execução só é possível após o exaurimento dos recursos ainda
cabíveis em segundo grau (embargos de declaração).
Recursos no TRF4
Os recursos possíveis são os embargos de declaração, utilizados para
pedido de esclarecimento da decisão, quando houver no acórdão (decisão
da Turma) ambiguidade, obscuridade, contradição ou omissão. Os embargos
de declaração devem ser interpostos no prazo de dois dias contados da
intimação dos advogados do acórdão. Como a decisão foi unânime, não
cabem embargos infringentes.
Veja mais imagens do julgamento no Flickr do TRFACr 5046512-94.2016.404.7000/TRF
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