DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. PRAZO PRESCRICIONAL DA PRETENSÃO DE RESTITUIÇÃO DE SATI. RECURSO REPETITIVO. TEMA 938.
Incide a prescrição trienal
sobre a pretensão de restituição dos valores pagos a título de
comissão de corretagem ou de serviço de assistência
técnico-imobiliária (SATI), ou atividade congênere (art. 206, § 3º,
IV, CC). A Segunda Seção debateu profundamente questão
semelhante no julgamento do REsp 1.360.969-RS (DJe 19/9/2016),
discutindo o prazo prescricional incidente sobre a pretensão de
repetição do indébito formulada por consumidor contra empresas de
planos de saúde, alegando-se a abusividade de cláusulas contratuais
relativas ao reajuste de mensalidades. Após longo e profícuo debate
sobre a referida questão, prevaleceu o entendimento de ser hipótese
de prescrição trienal (3 anos), aplicando-se a regra especial do
art. 206, § 3º, IV, do CC, relativa a pretensão de ressarcimento do
enriquecimento sem causa. Ademais, a jurisprudência do STJ, em
precedente da Terceira Turma (REsp 1.238.737-SC, DJe 17/11/2011),
acerca de pedido de repetição do indébito formulado por consumidor
alegando a cobrança indevida de valores por fornecedor,
posicionou-se nessa mesma linha. O caso ora analisado é semelhante
aos precedentes aludidos, pois a pretensão central da parte
demandante é o ressarcimento das parcelas relativas à comissão de
corretagem e ao serviço de assessoria técnico-imobiliária (SATI),
que teriam sido pagas indevidamente por serem abusivas as cláusulas
que atribuíram esse encargo aos consumidores. Ou seja, a alegação é
a ocorrência de enriquecimento sem causa como premissa fundamental
da pretensão central de repetição do indébito. Especificamente em
relação ao prazo trienal, a orientação da Turma de Uniformização do
TJDFT firmou-se no seguinte sentido (AC 879.851, DJe 14/7/2015):
"Uniformiza-se o entendimento de que o prazo prescricional, nas
ações que tenham por fundamento o enriquecimento sem causa, com
pedido de devolução de taxa de corretagem é de 3 (três) anos."
Enfim, mostra-se bastante razoável a alegação de incidência da
prescrição trienal aos pedidos de repetição do indébito referentes
aos valores pagos a título de comissão de corretagem ou de serviço
de assistência técnico-imobiliária (SATI), com fundamento no art.
206, § 3º, IV, do CC. REsp 1.551.956-SP, Rel. Min. Paulo de
Tarso Sanseverino, Segunda Seção, por unanimidade, julgado em
24/8/2016, DJe 6/9/2016.
DIREITO
DO CONSUMIDOR. VALIDADE DO REPASSE DA COMISSÃO DE CORRETAGEM AO
CONSUMIDOR PELA INCORPORADORA IMOBILIÁRIA. RECURSO REPETITIVO. TEMA 938.
É válida a cláusula
contratual que transfere ao promitente-comprador a obrigação de
pagar a comissão de corretagem nos contratos de promessa de compra e
venda de unidade autônoma em regime de incorporação imobiliária,
desde que previamente informado o preço total da aquisição da
unidade autônoma, com o destaque do valor da comissão de
corretagem. Registre-se que o principal ponto controvertido
é a verificação da possibilidade de transferência pelo vendedor
(incorporadora) ao comprador (consumidor), mediante cláusula
contratual, da obrigação de pagar a comissão de corretagem. A
questão é especialmente relevante, pois deve ser aferida a validade
dessa cláusula na perspectiva do Direito do Consumidor, uma vez que
se trata, em regra, de relação de consumo (art. 2º e 3º do CDC).
Discute-se, em outras palavras, a possibilidade de assunção da
dívida relativa à comissão de corretagem pelo consumidor. A prática
comercial tem evidenciado que as incorporadoras têm efetivamente
transferido, expressa ou implicitamente, esse custo para o
consumidor. A principal vantagem para as incorporadoras é a
terceirização desse serviço a profissionais da área de corretagem.
Outra vantagem dessa transferência para as incorporadoras seria a
redução da base de cálculo dos tributos incidentes sobre a aquisição
da unidade imobiliária. E a terceira vantagem seria a desnecessidade
de restituição do valor da corretagem, em caso de desfazimento da
promessa de compra e venda, uma vez que o pagamento passa a ser
feito diretamente ao corretor. Afasta-se, desde logo, a alegação de
venda casada, pois ocorre apenas a terceirização dessa atividade de
comercialização de unidades imobiliárias para profissionais do
setor, concentrando-se a incorporadora na sua atividade de
construção de imóveis. Essas vantagens obtidas pelas incorporadoras,
independentemente da verificação da sua licitude do ponto de vista
fiscal, não causam prejuízo econômico para os consumidores, pois o
custo da corretagem, mesmo nos contratos entre particulares, é
normalmente suportado pelo comprador, seja embutido no preço, seja
destacado deste. Observe-se que o Direito do Consumidor, apesar de
seu marcado caráter protetivo, não chega ao ponto de subverter a
natureza onerosa das relações negociais no mercado de consumo,
exigindo apenas transparência no seu conteúdo. Desse modo, sob a
ótica do repasse de custos e despesas, chega-se diretamente à
conclusão no sentido da inexistência de prejuízo aos consumidores
com a assunção de dívida, pois, não fosse desse modo, o custo seria
embutido no preço total da compra e venda. Pode-se concluir,
portanto, que, em princípio, é válida a cláusula que transfere para
o consumidor a obrigação de pagar a comissão de corretagem,
exigindo-se apenas transparência nessa atribuição. Além disso, no
âmbito das relações de consumo, a informação adequada sobre os
produtos e serviços não é apenas um direito do consumidor, mas um
dever imposto ao fornecedor, conforme se pode extrair, dentre
outros, dos arts. 31, 46 e 52 do CDC. O dever de informação
constitui um dos princípios consectários lógicos do princípio da
boa-fé objetiva, positivado tanto no CC (art. 422), como no CDC
(art. 4º, III), consubstanciando os deveres de probidade, lealdade e
cooperação, que deve pautar não apenas as relações de consumo, mas
todas as relações negociais. Esse dever de informação é de tal modo
acentuado que, segundo doutrina, a relação de consumo estaria regida
pela regra caveat praebitor (acautele-se fornecedor), que
impõe ao fornecedor uma obrigação de diligência na atividade de
esclarecer o consumidor, sob pena de desfazimento do negócio
jurídico ou de responsabilização objetiva por eventual dano causado,
ao passo que, num sistema jurídico liberal, aplica-se a regra
inversa, caveat emptor (acautele-se comprador), incumbindo
ao comprador o ônus de buscar as informações necessárias sobre o
negócio jurídico que pretende celebrar. O dever de informação
referente ao preço na venda a crédito encontra-se regulamentado
tanto pelo art. 52 do CDC como pelo art. 3° Decreto n. 5.903/2006,
exigindo do fornecedor clareza acerca do preço total dos produtos e
serviços, discriminando-se as principais parcelas que o integram.
Registre-se que o preço total, como o próprio nome indica,
representa o quanto o consumidor terá que pagar para adquirir o
produto ou contratar serviço, sem nenhum acréscimo pecuniário. Para
cumprir essa obrigação de informação, deve a incorporadora informar
ao consumidor, até o momento de celebração do contrato de promessa
de compra e venda, o preço total de aquisição da unidade
imobiliária, especificando o valor da comissão de corretagem, ainda
que essa venha a ser paga destacadamente. Efetivamente, nos termos
do disposto no art. 30 do CDC, toda informação ou publicidade
suficientemente precisa vincula o fornecedor. Desse modo, uma vez
ofertada à venda uma unidade autônoma, o fornecedor fica vinculado à
proposta, que deve ser devidamente respeitada, inclusive integrando
o contrato posteriormente celebrado. Na hipótese de recusa no
cumprimento da proposta, o CDC assegura a possibilidade de se exigir
o cumprimento forçado dela, dentre outras alternativas. REsp 1.599.511-SP, Rel. Min. Paulo de
Tarso Sanseverino, Segunda Seção, por unanimidade, julgado em
24/8/2016, DJe 6/9/2016.
DIREITO
DO CONSUMIDOR. ABUSIVIDADE DE COBRANÇA DE SATI AO CONSUMIDOR PELO
PROMITENTE-VENDEDOR DE IMÓVEL. RECURSO REPETITIVO. TEMA 938.
É abusiva a cobrança pelo
promitente-vendedor do serviço de assessoria técnico-imobiliária
(SATI), ou atividade congênere, vinculado à celebração de promessa
de compra e venda de imóvel. O fornecedor tem o dever de
prestar ao consumidor informações claras, adequadas e precisas
acerca de seus produtos e serviços. Além do pagamento da comissão de
corretagem, têm sido transferidos ao promitente-comprador os custos
do serviço de assessoria técnico-imobiliária (SATI), consistente na
prestação de esclarecimentos técnicos e jurídicos acerca das
cláusulas do contrato e das condições do negócio. Na alienação de
unidades autônomas em regime de incorporação imobiliária, essa
atividade de assessoria prestada ao consumidor por técnicos
vinculados à incorporadora constitui mera prestação de um serviço
inerente à celebração do próprio contrato, inclusive no que tange ao
dever de informação, não constituindo um serviço autônomo oferecido
ao adquirente, como ocorre com a corretagem. Verifica-se, nesse
caso, flagrante violação aos deveres de correção, lealdade e
transparência, impostos pela boa-fé objetiva, tendo em vista a
cobrança, a título de serviço de assessoria técnico-imobiliária
(SATI), pelo cumprimento de deveres inerentes ao próprio contrato
celebrado. A abusividade dessa cláusula contratual deflui do
disposto no art. 51, IV, do CDC. Consideram-se, assim, nulas de
pleno direito as cláusulas que obrigam o consumidor a pagar o
serviço de assessoria técnico-imobiliária (SATI) ou congênere,
ex vi do art. 51, IV, in fine, do CDC. Ademais,
essa assessoria é um serviço que envolve o elemento confiança
(intuitu personae). Assim, se o consumidor necessitar de
alguma assessoria técnica ou jurídica para orientá-lo acerca do
contrato ou de outros detalhes relativos à aquisição do imóvel, pode
contratar diretamente um profissional ou advogado da sua confiança,
e não alguém vinculado à incorporadora. O próprio Conselho Federal
de Corretores de Imóveis (COFECI), mediante a Resolução n.
1.256/2012, estatuiu a seguinte norma proibitiva: "Art. 3º - É
vedado aos inscritos no Regional cobrarem de seus clientes, para si
ou para terceiros, qualquer taxa a título de assessoria
administrativa jurídica ou outra, assim como devem denunciar ao
Regional a cobrança de tais taxas quando feitas pelo incorporador,
pelo construtor ou por seus prepostos." Manifesta, portanto, a
abusividade de qualquer cláusula que estabeleça a cobrança desse
serviço de assessoria técnico-imobiliária (SATI) ou atividade
congênere. REsp 1.599.511-SP, Rel. Min. Paulo de
Tarso Sanseverino, Segunda Seção, por unanimidade, julgado em
24/8/2016, DJe 6/9/2016.
DIREITO
PROCESSUAL CIVIL E DO CONSUMIDOR. LEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM DE
INCORPORADORA IMOBILIÁRIA EM DEMANDA QUE OBJETIVA RESTITUIÇÃO DE
COMISSÃO DE CORRETAGEM E DE SATI. RECURSO REPETITIVO. TEMA 939.
Tem legitimidade passiva "ad
causam" a incorporadora, na condição de promitente-vendedora, para
responder a demanda em que é pleiteada pelo promitente-comprador a
restituição dos valores pagos a título de comissão de corretagem e
de taxa de assessoria técnico-imobiliária, alegando-se prática
abusiva na transferência desses encargos ao consumidor. De
início, levando em consideração, em tese, as alegações dos
promitentes-compradores (consumidores), observa-se, nesse tipo de
demanda, afirmações como a de que o consumidor compareceu a um
estande de vendas com o objetivo de comprar um imóvel, mas acabou
sendo obrigado a arcar com os custos dos serviços de corretagem
prestados por corretores escolhidos pela incorporadora.
Analisando-se esse tipo de alegação com base na teoria da asserção -
prevalente na jurisprudência do STJ (REsp 818.603-RS, Terceira
Turma, DJe 3/9/2008; e REsp 1.395.875-PE, Segunda Turma, DJe
7/3/2014) -, cumpre indagar se, caso sejam verdadeiras as afirmações
do autor, a incorporadora poderia ser condenada a ressarcir os
valores pagos a título de corretagem? À primeira vista, pode parecer
que caberia ao corretor figurar no polo passivo da relação
processual, pois foi quem recebeu os valores diretamente do
consumidor. Contudo, do exame das alegações dos consumidores,
geralmente não se observa nenhuma insurgência quanto à existência de
um contrato de corretagem e à necessidade de se remunerar o corretor
pelos serviços prestados. Nesses casos, a questão em geral suscitada
pelos consumidores se limita a estabelecer quem deve assumir o
encargo da restituição dessa remuneração. Sob a ótica dos
consumidores, a corretagem foi contratada pela incorporadora de modo
que ela é quem deveria responder por esse encargo. Por decorrência
lógica, para que o encargo recaia sobre a incorporadora, deve-se
admitir o ajuizamento da demanda contra esta, ou seja, reconhecer a
legitimidade passiva ad causam. Observe-se que o raciocínio
acima se limita à questão da legitimidade passiva, pois a análise da
efetiva obrigação de ressarcir os consumidores é questão de mérito,
a ser enfrentada em outra oportunidade. De outra parte, com relação
aos custos do serviço de assessoria técnico-imobiliária (SATI), os
consumidores também alegam, geralmente, que se trata de serviço
contratado pela incorporadora, mas com encargo transferido para
consumidores. As alegações deduzidas pelos consumidores com relação
à SATI são semelhantes às afirmações feitas a respeito da comissão
de corretagem, devendo-se adotar, portanto, a mesma solução,
admitindo-se a legitimidade passiva da incorporadora. REsp 1.551.968-SP, Rel. Min. Paulo de
Tarso Sanseverino, Segunda Seção, por unanimidade, julgado em
24/8/2016, DJe 6/9/2016.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. ORDEM DE NOMEAÇÃO À PENHORA DE COTA DE FUNDO DE INVESTIMENTO. RECURSO REPETITIVO. TEMA 913.
A cota de fundo de
investimento não se subsume à ordem de preferência legal disposta no
inciso I do art. 655 do CPC/1973 (ou no inciso I do art. 835 do
CPC/2015). Inicialmente, cabe destacar que a tese firmada
pode nortear também a interpretação de casos vindouros, sob a
vigência do CPC/2015, pois, como visto, a redação do dispositivo
legal correlato não foi modificada. No mérito, registre-se que, de
acordo com o disposto no art. 2º, V, da Lei n. 6.385/1976 (que
disciplinou o mercado de valores mobiliários e criou a Comissão de
Valores Mobiliários), as cotas de fundos de investimento consistem
em valores mobiliários e, por isso, não se encontram em primeiro
lugar, na ordem legal de preferência de penhora, contida no inciso I
do art. 655 do CPC/1973, mas sim, expressamente, no inciso X (ou no
inciso III do art. 835 do CPC/2015; ou no inciso VIII do art. 11 da
Lei n. 6.830/1980). Ressai evidenciado, assim, pela própria
literalidade do dispositivo legal, que valores mobiliários, como é o
caso das cotas de fundo de investimento, não se confundem com
aplicações financeiras previstas na legislação processual (art. 655,
I, do CPC/1973). Veja-se, pois, que, diversamente do que ocorre com
o dinheiro em espécie, com o dinheiro depositado em conta bancária
ou com aquele representado por aplicações financeiras, as cotas de
fundo de investimento encontram-se invariavelmente sujeitas aos
riscos de mercado, de crédito e de liquidez, o que, por si só,
justifica a diversidade de gradação, para efeito de penhora, imposta
pela lei adjetiva civil. A partir da constituição do fundo de
investimento, que se dá por meio da reunião de aportes financeiros
manejados por investidores, o terceiro administrador os aplica em
títulos e valores mobiliários, com o intuito de obter
lucro/rendimento, sujeitando-se aos riscos das variações dos índices
do mercado financeiro. Destaca-se, por conseguinte, haver uma
indissociável vinculação entre os recursos aportados em um fundo de
investimento (convertidos, a partir de então, em cotas, de
titularidade de cada investidor) com a aplicação propriamente
realizada pelo fundo em determinados ativos financeiros, com
cotações no mercado. Por consectário, referidos recursos,
convertidos em cotas, passarão a seguir, necessariamente, a sorte
desses ativos investidos pelo fundo quanto à existência, à
negociabilidade, à liquidez e, portanto, aos riscos daí advindos, em
maior ou menor grau. Como assinalado, esses riscos são inerentes a
todos os fundos de investimento, que podem ser naturalmente
minorados - mas não totalmente extirpados - a depender dos ativos e
títulos financeiros que, de modo preestabelecido, venham a compor a
carteira do fundo e retratem, na medida do possível, um investimento
de perfil mais conservador. Tampouco se afigura influente à
conclusão o fato de o fundo de investimento ser qualificado como de
"renda fixa", pois, conforme determina a Instrução Normativa n. 505
da CVM, esse fundo tem "como principal fator de risco de sua
carteira" a variação da taxa de juros, de índice de preço, ou ambos,
devendo possuir "no mínimo 80% (oitenta por cento) da carteira em
ativos relacionados diretamente, ou sintetizados via derivativos, ao
fator de risco que dá nome à classe", (arts. 109 e 110), o que
evidencia, de igual modo, a presença dos riscos acima aludidos,
ainda que em menor grau. Assim gizados os contornos das cotas de
fundo de investimento, que, por expressa definição legal, constituem
valores mobiliários (art. 2º, V, da Lei n. 6.385/1976), pode-se
afirmar com segurança que essas não se incluem, para efeito de ordem
legal da penhora, no conceito "de dinheiro em aplicação financeira",
cuja eventual constrição judicial recai sobre numerário certo e
líquido, que ficará bloqueado ou depositado, à disposição do juízo
em que se processa a execução. REsp 1.388.642-SP, Rel. Min. Marco Aurélio
Bellizze, Segunda Seção, por unanimidade, julgado em 3/8/2016, DJe
6/9/2016.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. RECUSA DE NOMEAÇÃO À PENHORA DE COTAS DE FUNDO DE INVESTIMENTO. RECURSO REPETITIVO. TEMA 913.
A recusa da nomeação à
penhora de cotas de fundo de investimento, reputada legítima a
partir das particularidades de cada caso concreto, não encerra, em
si, excessiva onerosidade ao devedor, violação do recolhimento dos
depósitos compulsórios e voluntários do Banco Central do Brasil ou
afronta à impenhorabilidade das reservas obrigatórias. A
gradação legal estabelecida no art. 655 do CPC/1973, estruturado de
acordo com o grau de aptidão satisfativa do bem penhorável, embora
seja a regra, não tem caráter absoluto, podendo ser flexibilizada,
em atenção às particularidades do caso concreto, sopesando-se,
necessariamente, a potencialidade de satisfação do crédito, na
medida em que a execução se processa segundo os interesses do credor
(art. 612), bem como de acordo com a forma menos gravosa ao devedor
(art. 620). Essa compreensão, é certo, encontra-se sedimentada na
jurisprudência do STJ, por meio da Súmula n. 417, que assim dispõe:
"na execução civil, a penhora do dinheiro na ordem de nomeação de
bens não tem caráter absoluto". Ressai evidenciado, por conseguinte,
que, uma vez inobservada a gradação disposta na lei, afigura-se
lícito ao credor recusar a nomeação de cotas de fundos de
investimento, se, com esteio nas particularidades do caso, o aludido
valor mobiliário não guarda em si a esperada liquidez a satisfazer
prontamente a obrigação inadimplida, circunstância que não encerra,
em si, excessiva onerosidade ao devedor. Também sob o enfoque da
onerosidade excessiva ao devedor, absolutamente insubsistente a tese
de que a recusa da nomeação à penhora das cotas de fundo de
investimento importaria, por via transversa, na violação do
recolhimento dos depósitos compulsórios e voluntários do Banco
Central do Brasil (art. 10, IV, da Lei n. 4.595/1964) ou na afronta
da impenhorabilidade das reservas obrigatórias (art. 68 da Lei n.
9.069/1995). Reconhecida a licitude da recusa, cabe ao banco
executado, inclusive, como condição de procedibilidade de impugnação
ao cumprimento de sentença (definitiva), garantir o juízo, por meio
de constrição que recaia sobre numerário constante de suas agências
ou sobre o produto do capital investido em suas aplicações
financeiras, providência que não toca a intangibilidade dos
depósitos mantidos no Banco Central, tampouco a impenhorabilidade
das reservas bancárias. Aliás, linha argumentativa contrária não
encontra ressonância na jurisprudência pacífica do STJ, bem
sintetizada na Súmula n. 328, editada pela Corte Especial, nos
seguintes termos: "Na execução contra instituição financeira, é
penhorável o numerário disponível, excluídas as reservas bancárias
mantidas no Banco Central." REsp 1.388.642-SP, Rel. Min. Marco Aurélio
Bellizze, Segunda Seção, por unanimidade, julgado em 3/8/2016, DJe
6/9/2016.
Corte Especial
DIREITO ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL. ACESSO DO MPF A PROCEDIMENTOS DO TRIBUNAL DE ÉTICA E DISCIPLINA DA OAB.
O acesso do MPF às
informações inseridas em procedimentos disciplinares conduzidos pela
OAB depende de prévia autorização judicial. Em primeiro
lugar, cabe indicar que inexiste hierarquia entre as normas do art.
72, § 2º, da Lei n. 8.906/1994 (Estatuto da OAB) e do art. 8º, II, §
2º, da LC n. 75/1993 (Estatuto do Ministério Público da União). O
conflito entre as citadas normas é apenas aparente, uma vez que é
possível a convivência harmônica entre elas no mesmo sistema
jurídico, desde que observadas as limitações de cada uma.
Esclareça-se que interpretar sistematicamente as normas em aparente
conflito não equivale a negar vigência a nenhuma delas, apenas se dá
aplicação a cada uma conjugada com o disposto na outra (REsp
1.195.983-RS, Segunda Turma, DJe 31/3/2011). A mesma prática que se
aplica aos demais tipos de sigilo protegidos por lei deve ser
aplicada ao sigilo ético, fixado pela Lei n. 8.906/1994. Com efeito,
nos expressos termos do § 2º do art. 72 da Lei n. 8.906/1994, "o
processo disciplinar tramita em sigilo, até o seu término, só tendo
acesso às suas informações as partes, seus defensores e a autoridade
judiciária competente". Assim, diante dos termos claros com que foi
redigida a norma, fica evidente que a obtenção de cópia dos
processos ético-disciplinares é matéria submetida à reserva de
jurisdição, de modo que, excetuado o acesso pelas partes e seus
procuradores, somente mediante autorização judicial é que poderá ser
dado acesso a terceiros, ainda que sejam eles órgãos de persecução
dotados de poderes de requisição. Com efeito, tendo a lei
expressamente restringido o acesso de terceiros sem ordem judicial,
a única forma de compatibilizar os dois dispositivos legais é pela
compreensão de que o poder de requisição pelo órgão ministerial
encontra óbice naquelas hipóteses em que o legislador expressamente
reservou a quebra do sigilo à autoridade judicial. Nessa linha de
entendimento, frisa-se que a jurisprudência do STJ já definiu que o
art. 8º da LC n. 75/1993 não exime o Ministério Público de requerer
a autorização judicial para que haja o seu acesso a documentos
protegidos por sigilo legalmente estatuído (AgRg no HC 234.857-RS,
Quinta Turma, DJe 8/5/2014; e HC 160.646-SP, Quinta Turma, DJe
19/9/2011). Nesse contexto, o sigilo dos procedimentos e a reserva
de jurisdição para o compartilhamento de dados com terceiros em
relação aos processos ético-disciplinares contra advogados decorre
de expressa previsão na norma legal de regência, razão pela qual,
quanto a esse aspecto, deve ser reconhecida a extensão da tutela da
intimidade. Aliás, forçoso reconhecer que somente mediante a
declaração da inconstitucionalidade do art. 72, § 2º, da Lei n.
8.906/1994 é que poderia ser afastada a cláusula de reserva de
jurisdição para o acesso de terceiros aos processos disciplinares em
trâmite no Tribunal de Ética e Disciplina da OAB. Por outro lado,
cumpre notar que não se está aqui de forma alguma inviabilizando a
obtenção dos documentos e dados pelo Ministério Público, uma vez
que, ante a presença e a estruturação do Parquet, decerto
não importa em ônus excessivo ao órgão ministerial a necessidade de
requerer tal acesso judicialmente. Ao contrário, tal exigência, além
de assegurar a plena vigência de um sistema de freios e contrapesos,
próprios do regime republicano, também afasta o risco de que as
informações sigilosas juntadas aos autos sejam no futuro
consideradas nulas, contaminando todo o procedimento investigatório
e uma eventual ação judicial, uma vez que o acesso teria sido obtido
diretamente pelo Ministério Público, sem a autorização judicial, com
base no art. 8º da LC n. 75/1993, em divergência com o que prescreve
o STJ. Precedente citado do STF: AGR no RE 318.136 - RJ, Segunda
Turma, DJ 6/10/2006. REsp 1.217.271-PR, Rel. Min. Humberto
Martins, por maioria, julgado em 18/5/2016, DJe
6/9/2016.
DIREITO
PROCESSUAL CIVIL E PENAL. IMPOSSIBILIDADE DE REEXAME DE TEMPESTIVIDADE
DE AGRAVO DE INSTRUMENTO EM JULGAMENTO DE RECURSO ESPECIAL.
Ainda que a matéria do
processo judicial tenha natureza penal, não cabe, por ocasião do
julgamento de recurso especial, o reexame de ofício da
tempestividade do agravo de instrumento anteriormente provido para
determinar o processamento do próprio recurso especial. De
fato, a Corte Especial do STJ, por ocasião do julgamento dos EREsp
218.863-BA (DJe 5/2/2009) - ressalvando a norma inserta no § 2º do
art. 258 do RISTJ - pacificou entendimento no sentido de que é
cabível a interposição de agravo regimental contra decisão do
relator que dá provimento ao agravo de instrumento para determinar a
subida do recurso especial, quando a irresignação apresentada
referir-se à admissibilidade do próprio agravo. Dessa forma, não
tendo sido interposto o recurso pertinente, está preclusa a matéria
(art. 473 do CPC/1973), de modo que, o juízo de admissibilidade, no
momento em que apreciado o recurso especial, é apenas do próprio
recurso especial (EREsp 171.499-RS, Corte Especial, DJ 19/2/2001).
EREsp 1.414.755-PA, Rel. Min. João Otávio
de Noronha, por maioria, julgado em 18/5/2016, DJe
6/9/2016.
Primeira Turma
DIREITO TRIBUTÁRIO. IRRETROATIVIDADE DE MUTAÇÃO JURISPRUDENCIAL TRIBUTÁRIA.
O entendimento adotado no
REsp 1.192.556-PE (DJe 6/9/2010), em que a Primeira Seção do STJ,
segundo a sistemática do art. 543-C do CPC/1973, definiu que é
válida a incidência do IRPF sobre abono de permanência, não alcança
fatos geradores pretéritos ao referido julgado.
Inicialmente, deve-se registrar que a Primeira Turma do
STJ, no julgamento do AgRg no REsp 1.021.817-MG (DJe 1/9/2008),
adotou o posicionamento de que: "O constituinte reformador, ao
instituir o chamado 'abono permanência' em favor do servidor que
tenha completado as exigências para aposentadoria voluntária, em
valor equivalente ao da sua contribuição previdenciária (CF, art.
40, § 19, acrescentado pela EC 41/2003), pretendeu, a propósito de
incentivo ao adiamento da inatividade, anular o desconto da referida
contribuição. Sendo assim, admitir a tributação desse adicional pelo
imposto de renda, representaria o desvirtuamento da norma
constitucional". Posteriormente, por ocasião do julgamento do REsp
1.105.814-SC (DJe 27/5/2009), a Segunda Turma do STJ reformulou
repentinamente a orientação que fora traçada no supracitado
precedente. Essa situação de confronto perdurou até meados de 2010,
quando a controvérsia consistente na natureza jurídica do abono de
permanência para fins de incidência ou não de Imposto de Renda foi
submetida pela Primeira Seção do STJ ao procedimento dos recursos
repetitivos (REsp 1.192.556-PE, DJe 6/9/2010), ocasião em que
prevaleceu o ponto de vista defendido pela Segunda Turma, ou seja,
de que o abono de permanência possui natureza remuneratória por
conferir acréscimo patrimonial ao beneficiário, sujeitando-se à
incidência de Imposto de Renda. Nesse contexto, sustenta-se que
aquela orientação da Primeira Turma deve ter eficácia até o
julgamento do Repetitivo, e, somente desse ponto para adiante, por
amor ao precedente firmado sob a égide do art. 543-C do CPC/1973, a
diretriz então adotada deverá ser observada. De fato, por se tratar
de novo posicionamento que agrava o encargo tributário do
contribuinte, não se pode aplicá-lo a situações passadas, sob pena
de afronta ao princípio da segurança jurídica, que, diante de sua
importância inarredável, deve ser aplicado no intuito de impedir a
retroação de critérios jurídicos supervenientes a fatos geradores
passados quando maléfica ao sujeito passivo da obrigação tributária,
de modo a preservar as expectativas legítimas do contribuinte, além
de conferir segurança aos processos decisórios. Relativamente à
segurança jurídica e à irretroatividade de novo entendimento
jurisprudencial para alcançar situações pretéritas, há doutrina no
viés de que a irretroação de regra nova se aplica, inclusive, à
jurisprudência, e não apenas às leis, quando capaz de prejudicar
situação consolidada. Nessa perspectiva, a mutação jurisprudencial
tributária de que resulta oneração ou agravamento de oneração ao
contribuinte somente pode produzir efeitos a partir da sua própria
implantação, não alcançando, portanto, fatos geradores pretéritos,
consumados sob a égide da diretriz judicante até então vigorante.
Essa orientação apoia-se na tradicional e sempre atual garantia
individual de proibição da retroatividade de atos oficiais (ou
estatais) veiculadores de encargos ou ônus: sem esse limite, a
atividade estatal tributária ficaria à solta para estabelecer
exigências retrooperantes, desestabilizando o planejamento e a
segurança das pessoas. Diante dessas colocações, em que pese à força
de uma decisão pela sistemática do Recurso Representativo da
Controvérsia, soa claro que seu alcance não se poderia operar de
maneira retroativa, dado o longo intervalo de tempo relacionado à
consolidação da jurisprudência do STJ, por ocasião do julgamento do
REsp 1.192.556-PE, submetido ao rito do art. 543-C do CPC, datado de
25/8/2010. Postas essas premissas, conclui-se pela incidência do
IRPF sobre o abono de permanência apenas a partir de 2010, quando se
consolidou entendimento pela sistemática do representativo da
controvérsia. REsp 1.596.978-RJ, Rel. Min. Napoleão
Nunes Maia Filho, por maioria, julgado em 7/6/2016, DJe
1/9/2016.
Segunda Turma
DIREITO ADMINISTRATIVO. NULIDADE DE CONTRATO DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL PERTENCENTE À UNIÃO.
É nulo o contrato firmado
entre particulares de compra e venda de imóvel de propriedade da
União quando ausentes o prévio recolhimento do laudêmio e a certidão
da Secretaria do Patrimônio da União (SPU), ainda que o pacto tenha
sido registrado no Cartório competente. Para melhor
compreensão da controvérsia, transcreve-se o art. 3º do Decreto-Lei
n. 2.398/1987, que dispõe sobre foros, laudêmios e taxas de ocupação
relativas a imóveis de propriedade da União, e dá outras
providências: "Art. 3º A transferência onerosa, entre vivos, do
domínio útil e da inscrição de ocupação de terreno da União ou
cessão de direito a eles relativos dependerá do prévio recolhimento
do laudêmio, em quantia correspondente a 5% (cinco por cento) do
valor atualizado do domínio pleno do terreno, excluídas as
benfeitorias. § 1º As transferências parciais de aforamento ficarão
sujeitas a novo foro para a parte desmembrada. § 2º Os Cartórios de
Notas e Registro de Imóveis, sob pena de responsabilidade dos seus
respectivos titulares, não lavrarão nem registrarão escrituras
relativas a bens imóveis de propriedade da União, ou que contenham,
ainda que parcialmente, área de seu domínio: I - sem certidão da
Secretaria do Patrimônio da União - SPU que declare: a) ter o
interessado recolhido o laudêmio devido, nas transferências onerosas
entre vivos; b) estar o transmitente em dia, perante o Patrimônio da
União, com as obrigações relativas ao imóvel objeto da
transferência; e c) estar autorizada a transferência do imóvel, em
virtude de não se encontrar em área de interesse do serviço público;
II - sem a observância das normas estabelecidas em regulamento". Os
bens públicos podem ser classificados como bens de uso comum do
povo, bens de uso especial e bens dominicais. A diferença principal
entre eles reside no fato de que as duas primeiras espécies possuem
destinação pública, enquanto a terceira não a possui. Os terrenos
pertencentes à União são bens públicos, apesar de os bens dominicais
terem destinação precipuamente particular. Seguindo o escólio de
doutrina "o regime dos bens dominicais é parcialmente público e
parcialmente privado". Por isso, deve-se ter consciência de que a
sua natureza não é exclusivamente patrimonial, pois a Administração
Pública não deseja apenas auferir renda, mas também observar o
interesse coletivo representado pelo domínio direto do imóvel.
Conforme explicitado, os bens dominicais possuem especificidades com
relação à propriedade privada, que é regulada exclusivamente pelo
Código Civil. Dentre elas, existe o direito de transferir
onerosamente o domínio útil do imóvel mediante o pagamento de
laudêmio, pois se trata, como dito alhures, de relação de natureza
híbrida. Portanto, o contrato de compra e venda desses imóveis deve
se revestir de formalidades sem as quais se desnatura a sua natureza
jurídica. Logo, não é somente o pagamento do laudêmio que diferencia
essa espécie de transferência onerosa entre vivos, mas, e,
principalmente, a autorização da União para a realização do negócio
jurídico. Como se trata de bem público de interesse da União, ela
deve acompanhar de perto, por meio da SPU, a realização de sua
transferência, pois, como dispõe a lei, pode ocorrer a vinculação do
imóvel ao serviço público. Ademais, os Cartórios de Registro de
Imóveis têm a obrigação de não lavrar nem registrar escrituras
relativas a bens imóveis de propriedade da União sem a certidão da
SPU, sob pena de responsabilidade dos seus titulares. Precedente
citado: REsp 1.201.256-RJ, Primeira Turma, DJe 22/2/2011. REsp 1.590.022-MA, Rel. Min. Herman
Benjamin, por unanimidade, julgado em 9/8/2016, DJe
8/9/2016.
Terceira Turma
DIREITO CIVIL. INVASÃO DO MST E EXIGIBILIDADE DE CÉDULA DE CRÉDITO RURAL HIPOTECÁRIA.
A cédula de crédito rural
hipotecária permanecerá exigível na hipótese de o MST invadir o
imóvel do financiado e este deixar de comprovar que a invasão
constitui óbice intransponível ao pagamento do crédito e que não
existiam meios de evitar ou impedir os efeitos dessa ocupação.
O parágrafo único do art. 393 do CC estabelece que "o caso
fortuito ou de força maior se verifica no fato necessário, cujos
efeitos não era possível evitar ou impedir", do qual se extraem os
elementos caracterizadores das referidas excludentes de
responsabilidade: a necessariedade e a inevitabilidade. A respeito
dos elementos integrantes do caso fortuito ou de força maior,
segundo entendimento doutrinário, "Na circunstância concreta o que
se deve considerar é se houve impossibilidade absoluta que afetou o
cumprimento da prestação, o que não se confunde com dificuldade ou
onerosidade. O que se considera é se o acontecimento natural, ou o
fato de terceiro, erigiu-se como barreira intransponível à execução
da obrigação. [...] A inevitabilidade do evento é outro elemento a
ser considerado, igualmente de forma concreta. O fato deve ser
irresistível, invencível, atuando com força indomável e inarredável.
O que se considera é se o evento não podia ser impedido nos seus
efeitos. O fato resistível, que pode ser superado, não constitui
evento a autorizar a exoneração. É perfeitamente possível que o fato
seja imprevisível, mas suas consequências evitáveis. Se o devedor
não toma medidas para evitá-la, tipifica-se o inadimplemento e não a
impossibilidade com apoio no caso fortuito ou força maior". Cumpre
destacar que, a título de prudência do homem médio, tão logo
concretizada a invasão, é razoável que as autoridades policiais
sejam comunicadas, bem como sejam utilizadas, entre tantos outros
meios cabíveis, medidas possessórias protetivas. REsp 1.564.705-PE, Rel. Min. Ricardo
Villas Bôas Cueva, por unanimidade, julgado em 16/8/2016, DJe
5/9/2016.
DIREITO CIVIL. INVALIDADE DA PENHORA SOBRE A INTEGRALIDADE DE IMÓVEL SUBMETIDO A TIME SHARING.
É inválida a penhora da
integralidade de imóvel submetido ao regime de multipropriedade
(time-sharing) em decorrência de dívida de condomínio de
responsabilidade do organizador do compartilhamento. Na
espécie, reconhece-se que a natureza jurídica da multipropriedade
imobiliária bem mais se compatibiliza com a de um direito real. Isso
porque, extremamente acobertada por princípios que encerram os
direitos reais, a multipropriedade imobiliária, nada obstante ter
feição obrigacional aferida por muitos, detém forte liame com o
instituto da propriedade, se não for a sua própria expressão, como
já vem proclamando a doutrina contemporânea, inclusive num contexto
de não se reprimir a autonomia da vontade nem a liberdade contratual
diante da preponderância da tipicidade dos direitos reais e do
sistema de numerus clausus. Não se vê como admitir, no
contexto do CC/2002, óbice a se dotar o instituto da
multipropriedade imobiliária de caráter real, especialmente sob a
ótica da taxatividade e imutabilidade dos direitos reais inscritos
no art. 1.225. Primeiro, porque o vigente diploma, seguindo os
ditames do estatuto civil anterior, não traz nenhuma vedação nem faz
referência à inviabilidade de consagrar novos direitos reais.
Segundo, porque com os atributos dos direitos reais se harmoniza o
novel instituto, que, circunscrito a um vínculo jurídico de
aproveitamento econômico e de imediata aderência ao imóvel, detém as
faculdades de uso, gozo e disposição sobre fração ideal do bem,
ainda que objeto de compartilhamento pelos multiproprietários de
espaço e turnos fixos de tempo. REsp 1.546.165-SP, Rel. Min. Ricardo
Villas Bôas Cueva, Rel. para acórdão Min. João Otávio de Noronha,
por maioria, julgado em 26/4/2016, DJe 6/9/2016.
DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RESCISÃO DE DECISÃO JUDICIAL E RESTITUIÇÃO DE VERBA HONORÁRIA.
Se a decisão judicial que
ensejou a fixação de honorários de sucumbência for parcialmente
rescindida, é possível que o autor da rescisória, em posterior ação
de cobrança, pleiteie a restituição da parte indevida da verba
advocatícia, ainda que o causídico, de boa-fé, já a tenha levantado.
Inicialmente, destaca-se que os honorários de sucumbência
são verbas de natureza alimentar, de modo que a questão envolve
aparente conflito entre os princípios da irrepetibilidade dos
alimentos e o da vedação ao enriquecimento sem causa. De regra, a
jurisprudência tem-se firmado no sentido de que a verba alimentar é
irrepetível, com exceção das hipóteses em que tenha sido recebida de
má-fé ou em decorrência de decisão precária posteriormente
reformada. Entretanto, nas hipóteses em que isso foi afirmado,
evidenciam-se situações excepcionais, que não podem ser
transportadas para o âmbito do direito privado, notadamente nas
relações contratuais, sem as ressalvas e distinções necessárias. De
fato, não se trata de questionar a atribuição da natureza alimentar
aos honorários, mas sim de verificar o alcance dessa qualificação
para dirimir o suposto conflito entre os princípios da
irrepetibilidade dos alimentos e o da vedação ao enriquecimento sem
causa. É fato que uma decisão transitada em julgado gera legítima
confiança. Contudo, não se pode deixar de consignar que, se é
possível o ajuizamento de uma ação rescisória, sua procedência deve
ter reflexos práticos, inclusive na esfera patrimonial, sob pena de
absoluta ineficácia do provimento judicial. Como cediço, não há
preceitos absolutos no ordenamento jurídico. Não obstante ser
assente na jurisprudência a tese acerca da irrepetibilidade dos
alimentos, também esse postulado merece temperamentos, sobretudo
quando a verba de natureza alimentar - e não os alimentos
propriamente ditos - for flagrantemente indevida em razão da
superveniência da rescisão do julgado que fixou os honorários de
sucumbência. E assim o é porque a decisão em que o causídico se
amparou para receber a referida verba não mais existe no mundo
jurídico. Ora, não se pode obstruir a pretensão da parte que obteve
êxito em ação rescisória de buscar a restituição dos valores pagos
indevidamente a título de honorários de sucumbência, ainda que a
essa verba tenha sido atribuído caráter alimentar. Independentemente
da boa-fé do causídico, que acreditava, no momento em que levantou o
numerário relativo à verba de sucumbência de forma autônoma, que
aquele valor lhe era devido, o certo é que, com a alteração
proveniente da procedência da ação rescisória, aquele montante não
encontrava respaldo em nenhuma decisão judicial. Trata-se de
aplicação dos princípios da razoabilidade e da vedação ao
enriquecimento sem causa, isso sem falar na necessidade de se dar
máxima efetividade às decisões judiciais. Qual o sentido de, em
situações excepcionais, o ordenamento jurídico admitir o afastamento
da preclusão e da própria coisa julgada para desconstituir sentença
eivada de vício e, por construção pretoriana, impedir que, em
determinadas situações, o novo julgado produza plenos efeitos? A
única resposta é que não há sentido algum. Nessa perspectiva, a
consequência do enriquecimento sem causa é a restituição, ainda que
a falta de justa causa seja superveniente à liquidação da obrigação.
A propósito, prescrevem os arts. 884 e 885 do CC, in
verbis: "Art. 884. Aquele que, sem justa causa, se enriquecer à
causa de outrem, será obrigado a restituir o indevidamente auferido,
feita a atualização dos valores monetários"; e "Art. 885. A
restituição é devida, não só quando não tenha havido causa que
justifique o enriquecimento, mas também se esta deixou de existir".
Por fim, sendo a restituição devida, a boa-fé daquele que recebe
pagamento indevido é relevante para a análise e apuração do
quantum a ser devolvido. REsp 1.549.836-RS, Rel. Min. Ricardo
Villas Bôas Cueva, Rel. para acórdão Min. João Otávio de Noronha,
por maioria, julgado em 17/5/2016, DJe 6/9/2016.
DIREITO EMPRESARIAL E PROCESSUAL CIVIL. LEGITIMIDADE ATIVA DO CREDOR TRABALHISTA PARA PEDIR FALÊNCIA DE DEVEDOR.
A natureza trabalhista do
crédito não impede que o credor requeira a falência do devedor.
Da análise do art. 97, IV, da Lei n. 11.101/2005 (Art. 97.
Podem requerer a falência do devedor: [...] IV - qualquer credor),
verifica-se que o legislador conferiu ampla legitimidade ativa para
o requerimento de decretação de falência do devedor, de modo que, em
princípio, estarão todos os credores aptos a fazê-lo. Nessa linha,
há doutrina no sentido de que o credor "é, por excelência, o titular
da relação jurídica falimentar. [...] A lei não distingue entre
dívida civil, comercial, trabalhista ou fiscal, importando, isso
sim, que seja líquida, dando ensejo, repita-se, à ação executiva".
Em igual sentido, existem doutrinadores pátrios que têm entendido
que "a palavra 'qualquer', constante do inciso, sugere que todos os
credores, individualmente ou em conjunto, podem requerer a falência
do devedor. Incluir-se-iam, nesse rol, os credores civis,
comerciais, trabalhistas e fiscais". Assim, adota-se corrente
doutrinária que sustenta que: "Credores trabalhistas, fiscais,
acidentários podem em tese requerer a falência do devedor desde que
possuam o título executivo pertinente, seja ele judicial ou
extrajudicial e esteja protestado para fins falimentares. Neste
caso, é possível o pedido de falência com base no art. 94, I, da
LRF. Há, também, a possibilidade do pleito de falência com base no
art. 94, II quando superveniente uma execução frustrada". REsp 1.544.267-DF, Rel. Min. Ricardo
Villas Bôas Cueva, por unanimidade, julgado em 23/8/2016, DJe
6/9/2016.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. IMPOSSIBILIDADE DE REMESSA DE AGRAVO PELO STJ AO TRIBUNAL DE ORIGEM.
Após a entrada em vigor do
CPC/2015, não é mais devida a remessa pelo STJ, ao Tribunal de
origem, do agravo interposto contra decisão que inadmite recurso
especial com base na aplicação de entendimento firmado em recursos
repetitivos, para que seja conhecido como agravo interno.
Com o advento do CPC/2015, que entrou em vigor em 18 de
março de 2016 (Enunciado Administrativo n. 1 do Plenário do STJ),
passou a existir expressa previsão legal no sentido do não cabimento
de agravo contra decisão que inadmite recurso especial quando a
matéria nele veiculada já houver sido decidida pela Corte de origem
em conformidade com recurso repetitivo (art. 1.042, caput).
Tal disposição legal aplica-se aos agravos apresentados contra
decisão publicada após a entrada em vigor do Novo CPC, em
conformidade com o princípio tempus regit actum. Nesse
contexto, entende-se, diante da nova ordem processual vigente, não
ser mais caso de aplicar o entendimento firmado pela Corte Especial
no AgRg no AREsp 260.033-PR (DJe 25/9/2015), porquanto não há mais
como afastar a pecha de erro grosseiro ao agravo interposto já na
vigência do CPC/2015 contra inadmissão de especial que contrarie
entendimento firmado em recurso especial repetitivo e, assim,
determinar o retorno do feito ao Tribunal de origem para que o
aprecie como agravo interno. Ressalte-se, por oportuno, que ficam
ressalvadas as hipóteses de aplicação do aludido precedente aos
casos em que o agravo estiver sido interposto ainda contra decisão
publicada na vigência do CPC/1973. AREsp 959.991-RS, Rel. Min. Marco Aurélio
Bellizze, por unanimidade, julgado em 16/8/2016, DJe
26/8/2016.
Quarta Turma
DIREITO
PROCESSUAL CIVIL. LEGITIMIDADE PASSIVA DE SOCIEDADE EMPRESÁRIA
PROPRIETÁRIA DE SEMIRREBOQUE EM AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS.
A sociedade empresária
proprietária de semirreboque pode figurar no polo passivo de ação de
reparação de danos ajuizada em decorrência de acidente de trânsito
envolvendo o caminhão trator ao qual se encontrava acoplado.
De antemão, esclarece-se que determinar se a empresa
proprietária de semirreboque pode ser responsabilizada pelos danos
causados em acidente envolvendo caminhão trator configura questão
cuja solução não parece tranquila na jurisprudência do STJ. Com
efeito, em defesa da tese da irresponsabilidade, destaca-se o REsp
494.372-MG (Quarta Turma, DJe 29/3/2010), cuja orientação foi
adotada, mais recentemente, em decisão singular proferida no REsp
1.041.424-RS (publicada em 6/2/2012). Em diretriz oposta, há a
posição externada pela Terceira Turma no REsp 453.882-MG (DJe
25/9/2012), seguida no julgamento do AgRg no REsp 1.521.006-SP
(Terceira Turma, DJe 13/10/2015). De fato, a responsabilidade pelo
fato da coisa ocorre quando esta é a causa do evento danoso, mesmo
que não tenha havido a interferência ou o comando direto do dono.
Não se exige a constatação de conduta direta do dono ou de seus
prepostos. É o uso, fruição, proveito de uma coisa, por qualquer
meio, que acarreta a responsabilidade pelos danos que ela causar.
Nesse sentido, há doutrina no sentido de que: "configurado o nexo de
causa e efeito entre o bem e o dano, desponta automaticamente a
responsabilidade quando terceiros são atingidos", sendo "despiciendo
investigar se o dono procedeu com toda a diligência ou cuidado que
se impunha". Examinando os precedentes do STJ sobre o assunto,
percebe-se, no julgamento realizado pela Terceira Turma no REsp
453.882-MG (DJe 25/9/2012), dois fortes fundamentos pela
responsabilização do proprietário do semirreboque: o primeiro,
referente ao interesse comercial que unia os proprietários dos dois
veículos, caminhão e semirreboque, e o segundo, consistente,
exatamente, na responsabilidade derivada da escolha mal feita pelo
dono, no que respeita ao usuário da coisa. Ademais, no que diz
respeito à inexistência de força motriz própria do semirreboque,
capaz de isentá-lo de responsabilidade, verifica-se que os veículos
são classificados pelo art. 96 do CTB das seguintes formas: quanto à
tração, quanto à espécie e quanto à categoria. Quanto à tração, os
veículos serão categorizados conforme a maneira com que serão
colocados em movimento: "Art. 96. Os veículos classificam-se em: I -
quanto à tração: a) automotor; b) elétrico; c) de propulsão humana;
d) de tração animal; e) reboque ou semi-reboque". Nessa linha, se o
veículo possui motor de propulsão, que o faz circular por seus
próprios meios, trata-se de um veículo automotor; se, em vez de
motor de propulsão movido a combustíveis fósseis, o funcionamento do
veículo for impulsionado por energia elétrica, classifica-se como
elétrico. Seguindo a classificação, passa-se aos veículos de
propulsão humana, de tração animal, reboques e semirreboques, que
são aqueles desprovidos de motor e que se utilizam de ação externa
para serem colocados em movimento. Aqui se encontram os reboques e
semirreboques que são tracionados por outro veículo automotor e que
se diferenciam pela maneira como são acoplados àquele veículo:
enquanto o reboque é engatado atrás de um veículo automotor, o
semirreboque apoia-se na unidade tratora ou é a ela ligada por meio
de articulação. Assim, o cavalo mecânico e o semirreboque trabalham
articuladamente, são dois veículos que unidos constituem partes de
um terceiro e específico veículo, o CVC (combinação de veículo de
carga), que somente existe a partir da junção dos dois primeiros.
Por essa razão, é impossível afirmar que o proprietário do
semirreboque é isento de responsabilidade, por ser aquele veículo
desprovido de força motora própria, uma vez que essa característica
não é suficiente ou decisiva para descaracterizá-lo como veículo.
Destaque-se, ainda, a Portaria n. 86/2006 do DENATRAN, que no uso de
suas atribuições conferidas pelo CTB, tratou de homologar os
veículos e as combinações de transporte de carga com seus
respectivos limites de comprimento e peso bruto total, e nesse
documento a classificação destinada ao caminhão e ao caminhão somado
ao semirreboque é a mesma: ambos são denominados composições. Nessa
extensão, o semirreboque não pode ser visto isoladamente, nem mesmo
o cavalão mecânico - que sem o semirreboque de nada serve -, devendo
ambos, a princípio, responder solidariamente pelos danos causados a
terceiros, dada a existência de interesse comum na união para o
desempenho da atividade. Por fim, não se pode olvidar que a escolha
quanto ao cavalo mecânico é do proprietário do semirreboque,
exsurgindo dessa constatação, como afirmado antes, a possível
responsabilidade pela má eleição, conduta negligente em relação à
coisa. Precedentes citados: REsp 453.882-MG, Terceira Turma, DJe
25/9/2012; AgRg no REsp 1.521.006-SP, Terceira Turma, DJe
13/10/2015. REsp 1.289.202-RS, Rel. Min. Luis Felipe
Salomão, por unanimidade, julgado em 2/6/2016, DJe
29/8/2016.
DIREITO
PROCESSUAL CIVIL. LEGITIMIDADE ATIVA AD CAUSAM PARA PLEITEAR DE
EMPREENDEDOR DE SHOPPING CENTER INDENIZAÇÃO POR DANOS A ESTABELECIMENTO.
Ainda que, no contrato de
locação estabelecido com o empreendedor de shopping center,
conste como locatário apenas o sócio majoritário, a sociedade
empresária possui legitimidade ativa ad causam concorrente
para pleitear indenização por danos ao estabelecimento instalado no
centro comercial. Sob a perspectiva do estabelecimento, há
uma mitigação do axioma latino societas distat a singulis,
ou seja, embora haja uma conotação patrimonial, nele, há absoluta
sintonia de interesses da pessoa física com a jurídica, interesses
que estão diretamente ligados ao aviamento. Nessa linha, se uma
sociedade empresária desenvolve seu estabelecimento em um centro de
compras, por óbvio, busca obter lucros com sua atividade
empresarial, e, para que isso ocorra, há que se ter uma simbiose
entre a pessoa jurídica e a pessoa física, no tocante aos seus
interesses. Com efeito, por meio desse silogismo, é possível
perceber que, havendo pretensão que diga respeito ao estabelecimento
com todos os seus componentes, não há dúvidas de que tanto a
sociedade empresária quanto seus sócios possuem interesses
juridicamente protegidos capazes de habilitá-los como titulares de
direito material, podendo eventualmente deduzi-los em juízo. Ocorre
que a legitimidade está intrinsecamente ligada ao interesse de agir
da parte, isto é, há que se verificar, precipuamente, a utilidade
que a referida demanda terá para aquele cujo bem da vida sofreu ou
está na iminência de sofrer alguma lesão. Ademais, o debate a
respeito da legitimidade ativa da sociedade empresária não pode
passar à margem da efetiva consciência da atipicidade contratual
estabelecida com o shopping center, tampouco não se pode
olvidar do aspecto teleológico da legislação locatícia ora em exame.
Nesse contexto, cumpre destacar que o contrato de shopping
center possui inúmeras nuances em relação aos demais contratos
de locação convencionalmente celebrados. Apesar de tal pacto amparar
largamente o empreendedor - uma vez que este elabora previamente as
cláusulas contratuais, às quais os lojistas deverão se sujeitar -, é
plausível afirmar que a Lei n. 8.245/1991 (Lei de Locações), em
consonância com os princípios fundamentais estabelecidos pela CF,
também tutela os bens e interesses dos lojistas dentro dessa relação
negocial. Conforme apontado por doutrina, claramente se nota que o
escopo da legislação locatícia, especialmente no tocante ao lojista,
é o de salvaguardar seu estabelecimento empresarial, já que esse é
seu instrumento de trabalho. É evidente que também está presente, na
sociedade, o interesse de resguardar todo o complexo de bens que
compõe o estabelecimento, assim como para o sócio, signatário do
contrato. Mutatis mutandis, essa mesma linha argumentativa
foi utilizada pelo legislador no tocante à ação renovatória, na qual
se buscou estabelecer uma legitimidade concorrente para pleitear o
direito de inerência do locatário (art. 51, § 2º, da Lei de
Locações). REsp 1.358.410-RJ, Rel. Min. Luis Felipe
Salomão, por unanimidade, julgado em 4/8/2016, DJe
5/9/2016.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. INTIMAÇÃO PARA PERÍCIA MÉDICA EM AÇÃO DE COBRANÇA DE SEGURO DPVAT.
Em ação de cobrança de seguro
DPVAT, a intimação da parte para o comparecimento à perícia médica
deve ser pessoal, e não por intermédio de advogado.
Consoante determina a legislação processual civil, a
intimação é "o ato pelo qual se dá ciência a alguém dos atos e
termos do processo, para que faça ou deixe de fazer alguma coisa"
(art. 234 do CPC/1973; e art. 269 do CPC/2015). O diploma processual
também disciplina os meios pelos quais devem ser feitas as
intimações, tais como, pelo escrivão, oficial de justiça, correio,
publicação na imprensa oficial ou até mesmo por ocasião da
audiência. A doutrina distingue as intimações meramente
comunicativas, que criam ônus e dão início à contagem de prazos
processuais, daquelas que ordenam condutas e geram deveres para a
parte intimada. Nesse ponto, destaca-se que o ato processual em
questão se trata de intimação para a prática de uma conduta pessoal
da parte, qual seja: o comparecimento para a realização de perícia
médica. Dessa forma, por se tratar de ato que deve necessariamente
ser realizado pela parte interessada (ato personalíssimo), não se
mostra suficiente a intimação por intermédio de advogado. Acerca
disso, há doutrina no sentido de que: "Não valem as intimações
feitas à parte quando o ato processual a praticar deve ser do
advogado. A contrario sensu, não pode ser a intimação feita
ao representante processual, se o ato deve ser pessoalmente
praticado pela parte". Nessa linha, a parte deve ser intimada
pessoalmente para comparecer à perícia médica designada, visto que
não se trata de uma intimação meramente comunicativa, mas sim de uma
ordem para a prática de uma conduta que, frisa-se, somente pode ser
realizada pessoalmente pela parte interessada. Assim, a intimação
pessoal da parte que será submetida ao exame pericial revela-se
indispensável, por se tratar de ato personalíssimo, cuja intimação
não pode ser suprida por intermédio do advogado. Precedente citado:
REsp 1.309.276-SP, Terceira Turma, DJe 29/4/2016. REsp 1.364.911-GO, Rel. Min. Marco Buzzi,
por unanimidade, julgado em 1/9/2016, DJe 6/9/2016.
Sexta Turma
DIREITO PENAL. AUSÊNCIA DE BIS IN IDEM NA DOSIMETRIA DA PENA DE CRIME DE TORTURA.
No caso de crime de tortura
perpetrado contra criança em que há prevalência de relações
domésticas e de coabitação, não configura bis in idem a
aplicação conjunta da causa de aumento de pena prevista no art. 1º,
§ 4º, II, da Lei n. 9.455/1997 (Lei de Tortura) e da agravante
genérica estatuída no art. 61, II, f, do Código Penal.
A causa de aumento prevista pela legislação especial (art.
1º, § 4º, II, da Lei de Tortura) está descrita nos seguintes termos:
"§ 4º Aumenta-se a pena de um sexto até um terço: [...] II - se o
crime é cometido contra criança, gestante, portador de deficiência,
adolescente ou maior de 60 (sessenta) anos". A seu turno, a
circunstância agravante prevista no Código Penal possui a seguinte
redação: "Art. 61 - São circunstâncias que sempre agravam a pena,
quando não constituem ou qualificam o crime: [...] II - ter o agente
cometido o crime: [...] f) com abuso de autoridade ou
prevalecendo-se de relações domésticas, de coabitação ou de
hospitalidade, ou com violência contra a mulher na forma da lei
específica". De fato, a citada majorante prevista na Lei de Tortura
busca punir de forma mais rígida o autor de crime que demonstrou
maior covardia e facilidade no cometimento da infração penal,
justamente pela menor capacidade de resistência das vítimas ali
elencadas. Há, pois, um nexo lógico entre a conduta desenvolvida e o
estado de fragilidade da vítima. Em sentido diametralmente oposto,
descortina-se a referida agravante prevista pelo Código Penal,
punindo com maior rigor a violação aos princípios de apoio e
assistência que deve haver nas situações em que há relação de
autoridade entre a vítima e o agressor, bem como a maior
insensibilidade moral do agente, que viola o dever de apoio mútuo
existente entre parentes e pessoas ligadas por liames domésticos, de
coabitação ou hospitalidade, sem prejuízo dos crimes praticados com
violência doméstica contra a mulher. Em suma, a majorante tem por
finalidade punir de forma mais severa aquele que se favorece da
menor capacidade de resistência da vítima, ao passo que a agravante
tem por desiderato a punição mais rigorosa do agente que afronta o
dever de apoio mútuo existente entre parentes e pessoas ligadas por
liames domésticos, de coabitação ou hospitalidade, além dos casos de
violência doméstica praticada contra a mulher. Portanto, em se
tratando de circunstâncias e objetivos distintos, não há falar na
ocorrência de bis in idem. HC 362.634-RJ, Rel. Min. Maria Thereza de
Assis Moura, por unanimidade, julgado em 16/8/2016, DJe
29/8/2016.
Recursos Repetitivos - Decisões de Afetação
DIREITO ADMINISTRATIVO. TEMA 731.
Recurso Especial afetado à Primeira
Seção com representativo da seguinte controvérsia: "Discute-se a
possibilidade, ou não, de a TR ser substituída como índice de
correção monetária dos saldos das contas vinculadas ao FGTS".
REsp 1.614.874-SC, Rel. Min. Benedito
Gonçalves, DJe 16/9/2016.
DIREITO DO CONSUMIDOR. TEMA 929.
Recurso Especial afetado à Segunda
Seção com representativo da seguinte controvérsia: "Discussão quanto
às hipóteses de aplicação da repetição em dobro prevista no art. 42,
parágrafo único, do CDC". REsp 1.585.736-RS, Rel. Min. Paulo de
Tarso Sanseverino, DJe 14/9/2016.
DIREITO CIVIL. TEMA 958.
Recurso Especial afetado à Segunda
Seção com representativo da seguinte controvérsia: "Validade da
cobrança, em contratos bancários, de despesas com serviços prestados
por terceiros, registro do contrato e/ou avaliação do bem".
REsp 1.578.526-SP, Rel. Min. Paulo de
Tarso Sanseverino, DJe 2/9/2016.
DIREITO PROCESSUAL PENAL. TEMA 959.
Recurso Especial afetado à Terceira
Seção com representativo da seguinte controvérsia: "Discute-se se a
intimação do Ministério Público, realizada em audiência, determina o
início do cômputo do prazo para recorrer ou se o lapso recursal
somente se inicia com a remessa dos autos com vista à instituição".
REsp 1.349.935-SE, Rel. Min. Rogério
Schietti Cruz, DJe 16/9/2016.
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