Segunda-feira, 29 de julho de 2013
Ministro Lewandowski defere liminar com base na liberdade de imprensa
O presidente em exercício do Supremo Tribunal Federal (STF),
ministro Ricardo Lewandowski, deferiu liminar na Reclamação (RCL) 16074 e
suspendeu os efeitos da decisão do juízo da 27ª Vara Cível de São
Paulo, que havia impedido o site Consultor Jurídico (Conjur) de publicar
matérias sobre Luiz Eduardo Bottura, qualificado pelo veículo de
informações jurídicas como uma “figura pública e muito conhecida no
mundo jurídico por ter sido condenado 239 vezes por litigância de
má-fé”.
O site, de propriedade da Dublê Editorial Ltda. Epp (autora da
Reclamação), também havia sido intimado judicialmente a remover todas as
publicações relacionadas a Bottura. Na Reclamação ajuizada no STF,
a empresa alega que a decisão de primeira instância viola a autoridade
do STF no julgamento da Arguição de Descumprimento de Preceito
Fundamental (ADPF) 130, na qual a Corte decidiu que a Lei de Imprensa
não foi recepcionada pela Constituição de 1988 e que não pode haver
quaisquer obstáculos à liberdade de expressão e de imprensa.
Em sua decisão, o ministro Lewandowski destaca o entendimento da
Corte naquele julgamento e enfatiza que, “em um exame perfunctório dos
autos, como é próprio dos pedidos de jurisdição imediata, a decisão
reclamada parece ter ofendido a decisão emanada do Supremo Tribunal
Federal, nos autos da ADPF 130/DF, de relatoria do ministro Ayres
Britto”. O ministro cita precedentes do Supremo, entre eles o que
qualifica de “paradigmático” – a Reclamação (RCL) 15243, na qual o
ministro Celso de Mello afirma que o exercício da liberdade de imprensa
“não é uma concessão das autoridades” e sim “um direito inalienável do
povo”.
Naquele caso, o decano do STF lembrou que o exercício concreto, pelos
profissionais da imprensa, da liberdade de expressão, “assegura ao
jornalista o direito de expender crítica, ainda que desfavorável e em
tom contundente, contra quaisquer pessoas ou autoridades”. Assim, no
contexto de uma sociedade democrática, “nenhuma autoridade, mesmo a
autoridade judiciária, pode estabelecer padrões de conduta cuja
observância implique restrição aos meios de divulgação do pensamento”.
No mesmo sentido, o ministro Lewandowski deferiu medida liminar, no
exercício da presidência da Corte, na Ação Cautelar (AC) 3410, também de
relatoria do ministro Celso de Mello
VEJA A INTEGRA DA DECISÃO:
MEDIDA CAUTELAR NA RECLAMAÇÃO 16.074 SÃO PAULO
RELATOR : MIN. ROBERTO BARROSO
RECLTE.(S) : DUBLÊ EDITORIAL LTDA EPP
ADV.(A/S) : ALEXANDRE FIDALGO
ADV.(A/S) : MICHAEL GLEIDSON DE
ARAÚJO CUNHA
RECLDO.(A/S) : JUIZ DE DIREITO DA 27ª VARA CÍVEL DA
COMARCA DE SÃO PAULO
ADV.(A/S) : SEM REPRESENTAÇÃO NOS AUTOS INTDO.(A/S) : LUIZ EDUARDO AURICCHIO BOTTURA ADV.(A/S) : FABRÍCIO
DOS
SANTOS GRAVATA
INTDO.(A/S) : JOILDO
SANTOS
ADV.(A/S) : SEM REPRESENTAÇÃO NOS AUTOS
Trata-se de reclamação constitucional ajuizada por DUBLÊ EDITORIAL LTDA, contra ato da 27ª Vara Cível da São Paulo que teria censurado a reclamante em violação
ao decidido pelo Supremo Tribunal Federal nos autos da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 130/DF.
Alega o reclamante, em apertada síntese, que a decisão impugnada constitui ato censório que nega o teor do acórdão paradigma da presente ação “porque fez prevalecer o interesse individual sobre o interesse da sociedade, determinando o recolhimento de todo noticiário do veículo Consultor Jurídico e impedindo que esse veículo de comunicação exercesse plenamente o direito de imprensa” (fl. 8).
Sustenta que as matérias veiculadas dizem respeito a Luiz Eduardo Bottura, figura pública
e muito conhecida no mundo jurídico por ter sido condenado 239 (duzentas e trinta e nove) vezes por litigância de má-fé.
Ainda nesse sentido, aduz que o Senhor Bottura se intitula,
publicamente, como
“uma das mentes mais brilhantes do país” e, pelo fato de ser um litigante profissional, “deveria saber que os atos por si praticados provocam polêmica e causam preocupação à sociedade” (fl. 10).
Por fim, argumenta que “fica evidente a afronta perpetrada pela decisão reclamada contra a autoridade do julgamento da ADPF 130, como visto, garante
o exercício da exercício da liberdade de imprensa, vedando a censura no país, o é que inadmissível num estado Democrático de Direito como é o Brasil” (fl. 12).
Sobre o periculum in mora, alega que “o prejuízo no caso é evidente, na medida em que a Autora desta ação já foi intimada a cumprir a ordem de remoção das matérias consideradas ofensivas sem análise judicial, sob pena de bloqueio do domínio www.conjur.com.br, o que se demonstra desproporcional e inaceitável” (fl. 13).
Liminarmente, pede a “imediata suspensão do ato impugnado” (fl. 14).
No mérito, requer
“ainda, seja julgada procedente
esta Reclamação para cassar a decisão exarada pelo Juízo da 27ª Vara Cível de São Paulo, Dr. Victor
Frederico Kümpel, e ratificada pelo MM. Desembargador EGIDIO GIACOIA, relator do Agravo de Instrumento nº. 0139602- 55.2013.8.26.00005, desobrigando que seja cumprida a ordem de
remoção das matérias jornalísticas que tratam do Sr. Luiz Eduardo Bottura
do site Conjur, já que tal ordem reveste-se em verdadeira censura e óbice ao exercício da liberdade de imprensa, em total desconformidade com o quanto decido na ADPF 130”.
É o breve relatório. Decido.
Em um exame perfunctório dos autos, como é próprio dos pedidos de jurisdição imediata, observo que a decisão reclamada parece ter
ofendido a decisão emanada do Supremo Tribunal Federal, nos autos da ADPF 130/DF, de relatoria do Ministro Ayres Britto.
Naquele julgamento histórico, Sua Excelência assentou que:
“A expressão constitucional ‘observado o disposto nesta Constituição (parte final do art. 220) traduz a incidência dos
dispositivos tutelares de outros bens de personalidade, é certo, mas como consequência ou responsabilização pelo desfrute da ‘plena liberdade de informação jornalística’ (§
1º do mesmo art.
220 da Constituição Federal). Não há liberdade de imprensa pela metade ou sob as tenazes da censura prévia, inclusive a procedente do
Poder Judiciário, pena de se resvalar para o espaço constitucional da prestidigitação jurídica. Silenciando a Constituição quanto ao regime da internet (rede mundial de
computadores), não há como se lhe recusar a qualificação de território virtual livremente veiculador de ideias e opiniões, debates, notícias e tudo
o mais que signifique plenitude de comunicação”
(grifei).
Em caso semelhante, nos autos da Reclamação 11.292-MC/SP, o Relator, Ministro Joaquim Barbosa, proferiu a seguinte decisão:
“Há espaço suficiente para diferentes opiniões na esfera pública e é importante para a democracia brasileira que continue assim. Em julgamento monocrático sujeito à confirmação do Plenário, parece- me que o acórdão reclamado proibiu que uma determinada opinião fosse veiculada e, ao fazê-lo, violou o entendimento exposto por esta Corte
na ADPF 130.
Mais: ao proibir a divulgação de opinião, o acórdão evidentemente prejudica toda a coletividade, criando véu de silêncio sobre prática social cujo questionamento é legítimo (...).
A medida liminar justifica-se diante do dano difuso que a censura provoca.
Ante o exposto, defiro a liminar para suspender os efeitos do acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo” (grifei).
Ressalto, mais, que o Ministro Celso de Mello, em paradigmática
decisão, nos autos da Reclamação 15.243/SP, ajuizada pelo jornalista Paulo Henrique dos Santos Amorim, por afronta ao teor decisório da ADPF 130/DF, assentou que o exercício da liberdade de imprensa “não é umaconcessão das autoridades” e, sim, “um direito inalienável do povo”.
À ocasião, o decano
desta Suprema Corte lembrou que o exercício concreto, pelos
profissionais da
imprensa, da liberdade de expressão, “assegura ao jornalista o direito de expender crítica, ainda que desfavorável e em tom contundente, contra quaisquer pessoas ou autoridades”. Assim, no contexto de uma sociedade democrática, “nenhuma autoridade, mesmo a autoridade judiciária, pode estabelecer padrões de conduta cuja observância implique restrição aos meios de divulgação do pensamento”. No mesmo sentido, deferi medida liminar, no exercício
da presidência desta Suprema Corte, nos da AC 3.410/RJ, também relatada pelo eminente
Ministro Celso de Mello.
Isso posto, defiro o pedido de suspensão
imediata da decisão reclamada, sem prejuízo de melhor exame da questão pelo Relator sorteado.
Comunique-se.
Solicitem-se as informações de estilo. Publique-se.
Brasília, 26 de julho de 2013.
Ministro
RICARDO LEWANDOWSKI
RICARDO LEWANDOWSKI
Presidente em exercício